(FOLHAPRESS) – O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, chega aos cem dias de governo com um recorde de decretos assinados, mais do que qualquer outro presidente nos últimos 70 anos da história do país e com uma média muito superior inclusive à de seu próprio primeiro mandato.
Segundo dados do governo americano, até a última sexta-feira (25), Trump havia assinado 137 decretos. Nesta segunda-feira (28), com novas assinaturas que endurecem as políticas de imigração, esse número passará dos 140. De 2017 a 2021, sua primeira temporada no comando do país, o republicano assinou um total de 220 decretos. Apenas os ex-presidentes Franklin Roosevelt (1937-1945) e Harry Truman (1945-1953) assinaram 906 decretos e 2023, respectivamente, superando mais de 100 ordens ao longo de um ano.
O dispositivo tem sido usado por Trump para governar em diversas áreas, desde políticas de imigração até a mudanças sobre a pressão da água de chuveiros e sanitários. Os decretos fomentam uma segunda marca dos cem dias de Presidência, que são os embates travados na Justiça. Segundo o New York Times, 122 ordens foram suspensas ao menos temporariamente por juízes de diferentes instâncias.
Peter Shane, professor adjunto de direito da Universidade de Nova York, diz que não é incomum um governo começar com um alto volume de decretos. Ele cita, por exemplo, que na primeira semana, o antecessor Joe Biden assinou 23 decretos, duas proclamações e oito memorandos.
Trump, porém, supera essa tendência. “A produção de Trump é incomum tanto pelo volume (ele emitiu 39 decretos em sua primeira semana) quanto pelo ataque pragmático às estruturas, programas e normas existentes do governo”, avalia Shane.
Para W. Robert Thomas, professor de direito da Universidade Michigan, a forma como Trump tem executado suas ações dificulta a reação da oposição. “Os democratas definitivamente têm demorado a reagir à velocidade e à amplitude das mudanças trazidas pelo segundo governo Trump. Em sua defesa, muitas das ações do Executivo vão muito além do que a maioria dos observadores, e até mesmo outros republicanos, previam”, diz.
Ele cita as ações tomadas em reação a pedidos do Departamento de Eficiência Governamental, liderado ainda que não oficialmente por Elon Musk, que incluem a demissão em massa de uma série de funcionários do governo. “Existem sérias preocupações quanto à legalidade e à sensatez da mentalidade de ‘agir rápido e quebrar as coisas’ que os engenheiros do Doge trouxeram para o governo federal”, diz Thomas.
As avaliações de especialistas sobre a qualidade da democracia americana sofreram uma queda acentuada nos últimos meses, segundo dados divulgados pela rede de cientistas políticos Bright Line Watch. Desde o início das medições em 2017, os especialistas sempre atribuíram notas consideravelmente mais altas ao estado da democracia nos EUA do que o público geral e membros dos principais partidos políticos. O instituto ouviu 520 cientistas políticos entre janeiro e fevereiro.
Entre 2017 e 2024, essas avaliações oscilaram entre 61 e 70 pontos, com uma mínima anterior de 61 registrada em outubro de 2020. Após as eleições presidenciais de 2024, a nota caiu discretamente, passando de 69 em outubro para 67 em novembro.
No entanto, o período entre novembro de 2024 e fevereiro de 2025 marcou uma mudança de percepção. A nota média atribuída pelos especialistas despencou para 55 em 100 -o menor nível desde o início das medições, evidenciando um grau de preocupação sem precedentes entre analistas políticos.
Ainda mais alarmante é a projeção para os próximos anos: os especialistas estimam que, se a tendência atual continuar, a avaliação da democracia americana poderá cair para 47 pontos em 2027. O cenário reflete temores crescentes sobre o enfraquecimento de instituições, normas democráticas e o aumento de atitudes autoritárias dentro do governo.
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PRINCIPAIS ÁREAS DE DECRETOS E QUESTIONAMENTOS JUDICIAIS
Imigração
O governo enfrenta ao menos 29 ações contra decretos de Trump na área de imigração. O mais recente é o uso da Lei de Inimigos Estrangeiros para justificar a deportação de venezuelanos supostos membros da gangue Tren de Aragua. Um juiz bloqueou a deportação, que ocorreu da mesma forma, e o caso foi parar na Suprema Corte. O tribunal inicialmente permitiu que o presidente usasse a lei para deportações, desde que houvesse espaço para os envolvidos recorrerem das decisões o e depois proibiu o governo temporariamente de fazer expulsões com base nessa legislação.
Em outra frente, uma juíza determinou que o governo trouxesse de volta aos EUA o imigrante salvadorenho Kilmar Abrego Garcia, deportado de forma ilegal para El Salvador -o que a gestão diz não ter poder para fazer, a despeito da ordem judicial.
Além deste, há ao menos dez questionamentos à ordem que tenta revogar a cidadania por nascimento para filhos de imigrantes indocumentados, já considerada inconstitucional por tribunais federais. O governo também enfrenta ações contra decretos para punir cidades-santuário (mais receptivas para imigrantes), fazer remoções aceleradas, o fim do aplicativo que facilitava o agendamento de audiências com autoridades de imigração, a revogação de status de proteção temporária e refúgio a imigrantes e a transferência de migrantes para a base militar de Guantánamo.
Estrutura de governo
Ao menos 49 ações questionam mudanças implementadas por Trump no governo. Entre os decretos em discussão na Justiça, está o que cria o Doge, a obrigatoriedade de divulgar registros pessoais e financeiros ao órgão, o que reinstala o programa que permite substituir funcionários de carreira por nomeados políticos, o que desmantelou a Usaid, agência de ajuda internacional, entre outros.
Subsídios, Empréstimos e Assistência Governamental
Ações questionam decreto que pausou subsídios, empréstimos e assistência a estados e órgãos. Uma delas, a limitação de reembolsos disponíveis para subsídios de pesquisa médica pelo Instituto Nacional de Saúde (NIH), foi bloqueada pela Justiça.
Direitos e Liberdades civis
Ao menos 20 ações questionam os decretos de Trump que proíbem a participação de pessoas trans no serviço militar, restringem o reconhecimento de diferentes identidade de gênero e reforçam a ação de agentes de imigração em locais onde isso antes era vetado, como igrejas e escolas. Mais de dez ações questionam decretos que restringem iniciativas de Diversidade, Equidade, Inclusão e Acessibilidade (DEIA) em contratos governamentais e programas subsidiados.
Outras
O governo Trump também enfrenta ações contra decretos como o que determinou a demissão de agentes do FBI que investigaram a invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021, o que revogou políticas de Joe Biden na área climática e o que restringiu a transparência governamental.
Quais decretos estão parcialmente ou totalmente bloqueados:
– Fim do direito de cidadania de filhos de imigrantes por nascimento
– Restrição de contratação de empresas por terem políticas de diversidade e inclusão
– Acesso a tratamento para pessoas transgêneros com menos de 19 anos
– Bloqueio de verbas para ajuda internacional
– Suspensão de programas de refugiados
– Proibição de transgêneros se alistarem no serviço militar
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Fonte: Notícias ao Minuto